Tem início hoje, no Vaticano, um encontro inédito entre os presidentes das conferências episcopais de todo o mundo, que vai juntar 190 participantes para debater o tema da proteção de menores na igreja. Aos 114 presidentes, junta-se o Papa Francisco, representantes das ordens religiosas e outros especialistas e membros do clero que vão, em conjunto, refletir sobre esta problemática e encontrar forma de «transformar a Igreja no espaço seguro que ela deve ser», conforme disse D. Charles Scicluna, um dos membros da organização, na
conferência de imprensa que serviu para lançar o tema.
Os três dias vão ser dedicados a temas diferentes. Por ordem – Responsabilidade, Responsabilização (prestação de contas) e Transparência – cada um destes temas será abordado em cada dia sempre com a mesma metodologia: depois da oração da manhã, haverá discursos de especialistas ou membros do clero, possibilidade de perguntas da parte dos participantes, trabalho em grupos linguísticos (o português, ao contrário do Sínodo dos Jovens, não será uma das línguas), plenário com as conclusões desses trabalhos e uma oração final, à tarde, na qual dará testemunho uma vítima de abuso sexual.
A importância dos testemunhos das vítimas de abuso sexual tem sido um enfoque importante do Papa. Antes do encontro, pediu a todos os presidentes das conferências episcopais que escutassem as vítimas nos seus países antes do encontro, o
que foi feito por D. Manuel Clemente, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), bem como por muitos outros.
Posto isto, o encontro iniciará com um vídeo em que darão o seu testemunho cinco vítimas de abusos sexuais, e todos os dias os bispos irão escutar testemunhos de vítimas de abusos em todo o mundo na oração ao final da tarde. No sábado haverá uma celebração penitencial na qual tomarão parte todos os participantes e onde se irão ouvir mais testemunhos de abusos.

Em termos de oradores e participantes, sente-se a falta de mulheres. Dos 10 oradores, apenas três serão mulheres, e o próprio Cardeal Cupich concordou, na conferência de imprensa que apresentou o encontro, que reconheceu que «as pessoas que mais me ajudaram nestes casos foram mulheres, e gostava que estivessem mais mulheres» presentes. «Teremos três mulheres fortes a falar, e encontrámos vítimas masculinas e femininas, mas precisamos de fazer mais, a voz das mulheres é muito importante», reconheceu, embora, na verdade, a ausência continue a ser notada.
O Papa Francisco estará presente em todos os momentos dos trabalhos. No início, fará uma pequena introdução, e no final da missa de domingo, que não será presidida por ele, fará um discurso aos participantes que encerrará o encontro. Esse será o discurso que marcará o que sair destes dias de trabalho.
A comissão organizadora, explicou D. Charles Scicluna, começará «logo a seguir» ao encontro a trabalhar com as conclusões, sugestões e boas práticas trazidas pelos bispos para compilar, sistematizar e depois publicar tudo o que for relevante.
A vontade de transparência do Vaticano tem sido muito enfatizada. De tal forma que foi criado um site especificamente dedicado ao encontro –
www.pbc2019.org – no qual se poderão encontrar todas as intervenções dos oradores, uma contextualização de tudo o que a Igreja tem feito para combater este problema dos abusos, toda a legislação existente e muitos mais coisas sobre o assunto.
Lá podem encontrar-se informações sobre vários países que já têm regulamentação para lidar com esta problemática, e mais devem ser acrescentados, entretanto. Portugal não faz ainda parte desta lista, mas já tem, desde 2012, regulamentação para «o procedimento a adotar em caso de conhecimento de factos que indiciem ou evidenciem situações configuráveis como abuso sexual de menores», conforme se pode ler no
documento elaborado pela CEP.
À margem do encontro, a Comissão organizadora recebeu ontem de manhã em audiência privada «um grupo de representantes de vítimas de abuso por parte de membros do clero», declarou ao final do dia o diretor interino da Sala de Imprensa da Santa Sé, Alessandro Gisotti. «Estavam presentes 12 pessoas, homens e mulheres, de diferentes áreas do mundo e pertencentes a diversas organizações. O encontro durou pouco mais de duas horas. Os membros da Comissão estão muito gratos às vítimas que participaram do encontro pela sinceridade, profundidade e força dos seus testemunhos, que certamente os ajudará a entender sempre melhor a gravidade e a urgência dos problemas que serão enfrentados durante o Encontro», disse Alessandro Gisotti, citado pelo site Vatican News.
A Família Cristã está a acompanhar todos os trabalhos do encontro a partir do Vaticano, com uma equipa de reportagem em parceria com a Agência Ecclesia, a revista Flor de Lis, Jornal Voz da Verdade, a Rádio Renascença e a SIC.
Texto e fotos: Ricardo Perna
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