Um dos temas em foco aqui no X Encontro Mundial das Famílias foi a violência, um problema mundial, e que não distingue entre famílias com religião e sem religião, o que deixou Christauria Welland, psicóloga com mais de 25 anos de pesquisa nesta área, surpreendida quando começou a. estudar esta matéria. «Não tem havido muita investigação sobre o tema, mas a pesquisa que li e que é muito citada é que as pessoas que praticam religião não têm menos violência doméstica nas suas famílias que as famílias que não praticam nenhuma religião», considera esta especialista.
O problema não está na mensagem da Igreja, que fala muito do Amor na família e do respeito entre todos, mas antes na incapacidade da Igreja de falar sobre o assunto. «Quando comecei a fazer esta pesquisa, há 25 anos, nunca tinha ouvido um padre falar sobre violência doméstica no púlpito. Apesar de haver muitas oportunidades de o fazer durante o ano, pelas leituras da missa, muitos católicos ainda não ouviram e não sabem o que a Igreja ensina», critica.
Por isso, esta especialista não defende mudança na mensagem da Igreja, mas sim uma real aplicação da mesma. «Acho que não precisamos de mudar nada, precisamos é de aplicar o que já lá está. Mas não falamos disso, não sabemos disso... A importância de falar sobre a dignidade humana, sobre a violência, de ensinar as crianças desde mais novas estratégias para evitar a violência é muito grande. Se a única coisa a que eles estão expostos é violência, não vão saber agir de outra forma, acalmar-se, respeitar a dignidade de todos...», sustenta.
«A Pastoral Familiar vai ter de olhar para tantas destas crises com coragem»
D. Armando Domingues, bispo auxiliar do Porto e um dos dois bispos portugueses presentes no encontro, mostra muita preocupação com a situação em Portugal, onde os números têm crescido e conheceram nos últimos dias um desfecho trágico com a história da pequena Jéssica, «um mal que está agora a vir com muito mais força». «Não sei se a pandemia, esta agitação da guerra, as inseguranças, tudo aquilo que se meteu no coração do Homem, que dizíamos que ia ter consequências...», lamenta.
O problema está, segundo o prelado, no «individualismo» que causa «indiferença». «Educámos durante muito tempo para o individualismo, e, se não fazermos algo contra isto, fecha-se nas casas e os problemas ficam trancados», avisa.

Por isso, considera, «precisamos de voltar a esta pastoral de proximidade, de vizinhança». «Com a JMJ, somos chamados a ser hospitaleiros com todo o mundo. Caramba, e quando é que vamos ter este desafio de estar atento e de criar laços, relacionamentos novos com vizinhos, com quem é feliz ou vive triste, com quem tem mais ou tem menos?», diz, em jeito de desabafo.
D. Armando reconhece que esta é uma «fraqueza das comunidades, uma fraqueza dos cristãos e da vivência dos laços de vizinhança que todos deveríamos ter». «Neste momento, estão escondidos e só damos conta quando os problemas descambaram e já há violência, ou morte. Damos conta do fim, e não nos apercebemos do caminho doloroso que as pessoas estão a fazer», acusa.
O prelado da Comissão Episcopal do Laicado e Família considera que precisamos de «caminhar muito nesse aspeto» da vizinhança. «Cristo fez tudo por isso, mas eu não sei se neste momento estamos a fazer caminhos para nos aproximarmos da proximidade de Cristo, ou se estamos a fazer caminho para nos afastarmos dessa verdadeira proximidade, fraternidade, interesse», questiona, deixando uma certeza: «Quando assim for [os laços de vizinhança existirem], os problemas vêem-se», e podem resolver-se.
A reportagem em Roma no âmbito do X Encontro Mundial das Famílias resulta de uma parceria entre a Família Cristã, a Agência Ecclesia, o Diário do Minho e a Associação de Imprensa de Inspiração Cristã.
Texto e fotos: Ricardo Perna
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