Entra-se na casa da família Cavaco e percebe-se logo que ali vive uma família católica e de fé vivida. Há imagens de santos, fotografias do batismo e da comunhão dos filhos. É com um sorriso que Cláudia, 39 anos, e Pedro, 40, os pais, e Simão, 16 anos, Maria, 11 anos, e Teresa, de sete, nos recebem.
Verdi, o cão, aproxima-se para fazer o reconhecimento e mantém-se por perto, sossegado, enquanto conversamos.
A Quaresma é um tempo especial para esta família e Cláudia conta que na Quarta-Feira de Cinzas «vamos à Missa em família, tem a imposição das Cinzas e eles participam». Além disso, cumpre-se o jejum e a abstinência que a Igreja propõe. Os filhos também fazem à sua medida. «Sugerimos sempre que eles possam oferecer algo a Jesus. As meninas comem sempre uma goma a seguir à refeição e, no ano passado, resolveram que não iriam comer, iriam oferecer essa goma a Jesus.» Simão explica que faz «mais mortificações, como o jejum e a abstinência e tento estar mais em oração durante o dia». Que mortificações são essas? «Por exemplo, apetecer-me comer algo e não comer ou comer alguma coisa de que gosto menos: não me apetece rezar o Terço e rezo para evitar ficar preocupado porque não o fiz; estar com mais paciência com as minhas irmãs durante o dia ou estudar quando não me apetece.» E qual o sentido desses atos? O rapaz afirma que «é para fortalecer a vida cristã e vou sentindo que isso acontece». Já a irmã do meio, Maria, fala em «pequenos atos de amor» como não comer as gomas, de que gosta muito. «Não compro para fazer sacrifício. Não me apetece estudar, mas vou ter um teste e preciso. Ter paciência com os colegas na escola e com a Teresinha.»
Numa Quaresma anterior, a família colocou no oratório um prato com corações de papel e um copo. «A intenção é oferecerem qualquer coisa do dia a Jesus. É um sacrifício, como faziam os pastorinhos. Essas coisas que não lhes apeteça fazer mas que façam põem um coraçãozinho dentro do copo. No copo, estão os pequenos atos de amor.»
Mas será que os filhos percebem que este é um tempo diferente? Cláudia mostra como vai explicando: «Quaresma é um tempo de espera, em que pensamos um bocadinho: “vamos aproximar-nos de Jesus e como vamos fazer?” “Na Quarta-Feira de Cinzas, vamos começar um tempo que antecede a morte de Jesus e depois vem a alegria. Vamos tentar perceber como é que foi, como é que Jesus Se sentia.”»

Com crianças mais pequenas, na casa de Sónia e João Miranda Santos, os dois filhos mais velhos brincam com uma pista de carros. Gaspar tem sete anos e António três. Matias, de dois, e Inácio, de um ano, assistem à brincadeira. Os pais explicam que ter quatro filhos pequenos nunca os impediu de participar nas celebrações da Quaresma e da Semana Santa. «Adaptamos à idade que vão tendo. Mas sempre participámos na Via-Sacra, na Sexta-Feira Santa, e é sempre possível», conta a mãe.
O Tríduo Pascal é vivido em família. «Participamos sempre nas celebrações próprias dos dias. Eu sou enfermeira, e é sempre difícil gerir os meus horários, mas tentamos ter sempre este tempo livre nesses três dias para a alegria fantástica da Páscoa», explica Sónia.
Na sala, o canto de oração, no centro, é enfeitado de acordo com os tempos litúrgicos. «No ano passado, fizemos um cartaz com frases para o Gaspar que já lê, e uns símbolos para eles irem percebendo que é um tempo diferente. Foi tudo à volta das três ideias-chaves: rezar um bocadinho mais, estar mais disponível para os outros, a esmola e o jejum», explica a mãe. Este último aspeto foi trabalhado com as crianças. «Cada um deles escolheu uma coisa que, para eles, fosse importante. No ano passado, escolhemos algo relacionado com o alimento, para ser mais concreto. O Gaspar escolheu o prato preferido que não comeu durante a Quaresma. E nós também. Foi discutido em família e foi uma coisa pública. E eles depois cobraram se cumpriam e se cumpríamos», diz Sónia a rir. João salienta que «nas questões de fé e oração, as propostas são sempre feitas para o nível do Gaspar. Depois cada um faz à sua maneira». Sónia diz que tem sido «uma surpresa muito gira, porque vão acompanhando mesmo. As coisas vão fazendo sentido na cabecinha deles.»
Rezam o Terço diariamente e, ao domingo, a cruz grande sai da garagem para a Via-Sacra em casa. «Pomos a cruz no chão com velas e, como vamos fazendo várias vezes, eles vão ficando com isso guardado», revela o pai.