O Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados actualizou os dados de 2016. No ano passado, houve 65,6 milhões de pessoas deslocadas internamente ou refugiadas. À União Europeia (UE) chegam poucos. É a opinião de Ana Rita Gil, responsável pelo desenvolvimento da cátedra Direito das Crianças na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, e investigadora nesta área, que salienta que os dois milhões de refugiados «mas se compararmos com a população mundial não são números assim tão grandes. Em boa realidade é uma ínfima proporção da população mundial e uma ínfima proporção dos refugiados ao nível mundial». Aliás, só a Turquia tem três milhões de refugiados.
Esta investigadora e assessora do Tribunal Constitucional participou recentemente num colóquio sobre crianças desaparecidas organizado pelo Instituto de Apoio à Criança. Ana Rita Gil afirma que «se tem verificado uma infantilização dos fluxos migratórios. Em 2016, deu-se um ponto de viragem em que eram metade dos migrantes e refugiados». Sendo que crianças são todas as pessoas com menos de 18 anos. Das que chegaram à União Europeia e foram registadas, a maioria são rapazes com idades em média de 15/16 anos. Muitas dessas crianças não chegam a ser registadas. Umas morrem na viagem e outras desaparecem. «Estamos a assistir a uma média de duas crianças por dia mortas. É esmagador», admite.

Quanto aos desaparecimentos, Ana Rita Gil afirma que apenas se pode ter uma estimativa. O valor estimado é de 9 mil, mas pode ser muito superior porque este número refere-se apenas às que foram registadas pelas autoridades. Desaparecem e para onde vão? Que lhes acontece? A responsável pela cátedra Direito das Crianças explica que as causas mais otimistas «reportam que as crianças vêm já com um destino concreto em vista que lhes é vendido pelos traficantes: compram uma passagem para a Suécia, não compram uma passagem para a União Europeia. Obviamente que se são colocadas em Espanha vão tentar chegar à Suécia. Dizem os estudos que a maior parte destes desaparecimentos se deve às crianças procurarem outros países na União Europeia que elas prefiram». As razões mais pessimistas apontam para «o seu envolvimento em redes de tráfico e obviamente que as crianças mais pequenas são vítimas mais fáceis».

Ana Rita Gil é muito crítica da forma como a UE tem tratado os refugiados. Esta investigadora afirma que a União tem a legislação mais garantista do mundo em relação à protecção destas pessoas, mas na prática não a aplica. Ana Rita Gil defende que as crianças refugiadas ou migrantes que chegam à EU devem ter tratamento privilegiado no atendimento e ser imediatamente reagrupadas aos familiares e não terem de esperar, às vezes, em locais de detenção meses por uma resposta. Outra questão é a demora nos processos de verificação da idade. «Quando chegam às fronteiras, os polícias, os agentes de fronteira, devem olhar e ver primeiro uma criança. É criança tem de ter tratamento especial. Depois vai verificar-se a idade, ver se tem familiares, documentos, etc. Mas primeiro é uma criança.» A Portugal também têm chegado crianças sozinhas. Só em 2015 foram 54.
Reportagem: Cláudia Sebastião
Fotos: UNICEF
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