Maria Dulce e Fernando, Júlia e Mário. Estão separados por mais de 100 quilómetros. Uns vivem nos arredores da capital, os outros numa aldeia. Uns estão na casa dos 50 anos de idade, os outros à volta dos 80. Mas as diferenças são apenas exteriores. Falámos com ambos os casais sobre os netos e, no segundo caso, também bisnetos. Todos transbordam felicidade e amor. Nos gestos e na forma como falam, tornam-se meninos outra vez.
Maria Dulce e Fernando iluminam-se quando falam dos netos. Margarida e Vicente fazem as alegrias dos avós, que tentam ajudar no que podem. «Com o nascimento deles mudou tudo, é outra vida», diz Fernando. E estes avós estão muito presentes na vida dos netos. O Vicente, de 14 meses, fica com a avó até ela ir trabalhar. O mesmo já tinha acontecido com a irmã. «Eu entro no trabalho às 15 horas e saio às 23 horas. Dá para conciliar, mas tenho de ter ajuda das outras “bisas”.»
Avós portugueses são dos que mais cuidam dos netos
Vicente e Margarida não são caso único. Há muitas crianças que ficam com os avós até aos três anos, altura em que entram no jardim de infância. O estudo
A prestação de cuidados pelos avós na Europa, publicado pela Fundação Calouste Gulbenkian, revela que os avós portugueses são dos europeus que mais cuidam dos netos a tempo inteiro. Um terço das crianças portuguesas é criada pelos avós. Contribui para isso a elevada percentagem de mães com filhos até seis anos que trabalham a tempo inteiro.
É o que acontece com a mãe do Vicente e da Margarida. Mas os avós também ainda trabalham e a tempo inteiro. Maria Dulce e Fernando têm 56 e 59 anos, respetivamente. A reforma ainda vem bem longe. Ela trabalha num hospital, ele em transportes. Daí que o dia seja um «corre-corre», como diz a avó. «Levanto-me cedo para ter tudo preparadinho para quando ele chega, às 9 horas, comer. Ainda na sexta-feira fui ao parque com ele dar uma voltita, porque já tinha a comida pronta. Foi dar-lha, pô-lo a dormir e ir-me embora trabalhar.» Mas Maria Dulce não trocava esta correria por mais sossego. «É muito importante este apoio que lhes damos. Para eles e para nós, principalmente para nós. Gostamos muito.» Emociona-se quando conta o quanto lhe custou Margarida ir para a escola, depois de também ter ficado em casa com os avós.
Esta lógica de solidariedade tem por trás uma outra lógica: a do amor. Esta proximidade diária cria «uma relação especial», diz a avó. Maria Dulce reconhece que «os pais dizem que nós os estragamos com mimos a mais, que os deixamos fazer tudo. Agora temos mais paciência.» A conversa vai tendo Vicente e Margarida em pano de fundo. As crianças andam pela casa a brincar. O avô Fernando diz que com os netos ganhou uma nova vida. «Foi voltar à meninice. Sempre pensei que gostava de ter um rapazito. Assim que nasceu o Vicente é o “ai-Jesus” para poder brincar e jogar à bola. São brincadeiras normais. Andar no carrinho, empurrá-lo.»
Ser bisavô é diferente de ser avô?
Mário e Júlia estão casados há quase 58 anos. Uma vida longa em conjunto e que deu frutos. Têm cinco filhos, nove netos e três bisnetos. A mais pequenina ainda está na barriga da mãe. Deve nascer em setembro ou outubro. A alegria com que falam e vivem é contagiante. Toda a vida viveram dos trabalhos no campo. Mário trabalhou também numa fábrica.
Os trabalhos não diminuíram nem o tempo livre cresceu quando os netos nasceram. Júlia lamenta não ter podido acompanhá-los mais. «Eu não fui capaz de ajudar a criar os meus netos. A gente amanhava muito.» Tornam-se meninos quando falam dos bisnetos e descrevem as suas conquistas e aventuras. O avô Mário diz que «adora mais os bisnetos do que adorava os netos» e Júlia explica «os netos já estão grandes e os pequeninos gostam de miminhos. Aperta-se-nos o coração porque não somos capazes.» Estar com os bisnetos e cuidar deles «é uma alegria», dizem ao mesmo tempo.
Mário tem 82 anos, Júlia 77. Agora os dias continuam a ser passados nos cuidados com os terrenos que cultivam. Mas dividem-se também nas visitas aos bisnetos, que estão por perto. «Amanhã vou lá ver o mais pequenino», diz a avó Júlia. O avô Mário diz que também planeia uma visita esta semana. Afinal, já não o veem há quase uma semana e o coração não aguenta de saudades.
Leia a reportagem completa na FAMÍLIA CRISTÃ DE JULHO/AGOSTO DE 2016.
Texto e fotos: Cláudia Sebastião
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