Precisa de ajuda?
Faça aqui a sua pesquisa
«Há um povo que rejeita a eutanásia»
28.05.2018
A Federação Portuguesa pela Vida está a organizar uma manifestação para amanhã, dia 29, a partir das 13h30, junto à Assembleia da República, em Lisboa. No dia em que os deputados discutem e votam a legalização da eutanásia, José Maria Duque explica que o «objetivo é mostrar claramente que existe um povo e uma sociedade que defende a vida, rejeita a eutanásia e defende que o Estado não deve matar, deve cuidar». O porta-voz da campanha Toda a Vida Tem Dignidade afirma que «os sinais que estamos a receber é de uma forte adesão de pessoas a movimentarem-se para estarem presentes». O “alvo” da manifestação são os deputados que discutem durante a tarde a legalização da eutanásia, sobretudo os indecisos. «Que os deputados quando entrarem vejam e saibam que, em Portugal, há uma sociedade que rejeita a eutanásia e se mobiliza para vir na sua hora de almoço para aqui», afirma.

Foto da manifestação do passado dia 24.

José Maria Duque deixa o apelo: «É preciso que nós tenhamos uma palavra a dizer. Se isto passar por alguma razão, pensemos: daqui a um ou três anos o que a minha consciência me dirá? Irá acusar-me de não ter feito tudo o que poderia? Sei que não posso deixar de estar. Não quero que a minha consciência me acuse de não ter feito tudo o que podia.» Este porta-voz considera que «existe uma clara onda a levantar-se no país e não é só em Lisboa». Por todo o país há 11 vigílias contra a eutanásia esta segunda-feira à noite. Veja o mapa:
 
 

Também algumas comunidades portuguesas pelo mundo fazem o mesmo. Os organizadores das vigílias das comunidades portuguesas enviaram um comunicado onde dão conta das suas razões. «As Comunidades Portuguesas que orgulhosamente representam o nosso país por todo o mundo não podem aceitar uma lei que permite a morte dos mais fracos e indefesos. Ser português é cuidar dos que sofrem, não matá-los. Não nos podemos calar diante de uma lei que viola a nossa essência enquanto portugueses», afirmam. No texto, enviam uma mensagem aos deputados: «Exigimos que nos oiçam também a nós, aos cinco milhões de portugueses espalhados pelo mundo. E queremos dizer claramente: rejeitamos a morte a pedido, rejeitamos qualquer forma de violação da Vida Humana, queremos mais e melhores cuidados para os que sofrem.» O comunicado é assinado pelos responsáveis destas vigílias. Serão na China em Macau, Largo da Sé, às 18h15, e no Club Lusitano, em Hong Kong, às 18h00. Nos Estados Unidos da América: East Santa Clara Street, São José, às 18h00; Saint Marys Avenue, São Francisco às 12:15; e Portugal Institute, San Leandro, às 18h00. No Rio de Janeiro, Brasil, o local será a Casa de Macau e a hora 18h. Em Timor-Leste, estão previstas duas vigílias: Largo da Catedral, em Baucau, e Largo da Igreja, em Liquiçá. Ambas às 17h00.



Cada voto conta mesmo
Na Assembleia da República, os partidos já decidiram como vão votar. PCP e CDS votam contra os projetos de lei, somando 33 votos. Bloco de Esquerda, Partido Ecologista Os Verdes (PEV) e PAN votam a favor, com um total de 22 deputados. Formalmente, os deputados do PSD (89) e do PS (86) têm liberdade de voto, o que significa que podem votar como entenderem e serão eles a fazer aprovar ou chumbar a legalização da eutanásia. Sabe-se contudo que no PS, a posição maioritária será o voto a favor, até porque o partido tem projeto de lei próprio. Já no PSD é mais difícil fazer contas uma vez que o partido está dividido. Rui Rio é favorável à despenalização da eutanásia – mas não é deputado e não pode votar – e sabe-se que Paula Teixeira da Cruz, Adão Silva, Margarida Balseiro Lopes e Teresa Leal Coelho votarão a favor. No final da reunião da bancada social-democrata da semana passada, Fernando Negrão, líder parlamentar e contra eutanásia, disse aos jornalistas tinha havido «uma discussão muito viva» com «inúmeras intervenções, todas ou a maioria no sentido de votar contra os diplomas da eutanásia». A votação será nominal o que quer dizer que os deputados são chamados um a um por ordem alfabética e votam. Assim, só contam os votos de quem está mesmo no hemiciclo.
 
Cavaco e Ramalho Eanes são contra. Sampaio a favor
Dos antigos Presidentes da República vivos, Ramalho Eanes e Cavaco Silva já disseram ser contra a legalização da eutanásia. Num artigo publicado no sítio de Toda a Vida Tem Dignidade, Ramalho Eanes afirma que «é inadmissível que haja um retrocesso relativamente a essa secularização emancipadora e que o Estado se intrometa no “espaço privado”, íntimo, do homem e sobre ele legisle». O antigo Presidente da República defende que se trata de «uma perigosa regressão da cultura emancipadora do homem, uma abusiva intromissão na sua esfera moral». Por isso, Ramalho Eanes argumenta que «em vez de “liberalizante morte” — em claro e preocupante atropelo à transcendência desse espaço privado de cada indivíduo, da sua única e exclusiva verdade e responsabilidade —, interessante seria que outras medidas, outros procedimentos fossem adotados, como ampliar, generalizar e dar qualidade aos cuidados paliativos». E questiona também: «Porque não legislar sobre o testamento vital, tornando-o obrigatório? Todos os cidadãos deveriam decidir sobre se desejariam manter a vida, mesmo que só artificialmente suportada por equipamentos e/ou drogas, ou se pretenderiam, antes, que, em caso de nessa situação se encontrarem, os deixassem partir.»



Já Cavaco Silva, em entrevista à Rádio Renascença, afirmou que legalizar a eutanásia «é a decisão mais grave» que os deputados podem tomar. Por isso, assumiu que não votará em partidos que contribuam para aprovar os projetos de lei que propõem a legalização. «Como cidadão, sem responsabilidades políticas, o que posso fazer para manifestar a minha discordância é fazer uso do meu direito ao voto contra aquelas que votarem a favor da eutanásia. Nas eleições legislativas de 2019 não votar nos partidos que apoiarem a legalização da eutanásia e procurar explicar àqueles que me são próximos para fazer a mesma coisa», afirmou.

Jorge Sampaio está noutro campo desta discussão. Em declarações à Rádio Renascença, defendeu que «é preciso ter a possibilidade pessoal de decidir o nosso fim». Diz que o tema o divide a si próprio, mas «é a pessoa que está em causa, e é ela que deve ter o poder de decidir como é que quer passar para o outro lado». Mesmo assim, entende que é preciso «aprofundar o mais possível [a discussão] e que não haja nenhuma dúvida do ponto de vista científico».  Até porque «é um passo difícil que exige grande responsabilidade de todos os intervenientes e é isso que tenho algum receio, mas não vamos pensar que vão correr mal».
 
E depois de 29?
Dois cenários: aprovação ou chumbo. Se for chumbada, o processo fica por aqui e não poderão ser apresentadas novas propostas de legalização da eutanásia até ao final da legislatura.
Se a eutanásia for aprovada, chega a hora de Marcelo Rebelo de Sousa que pode promulgar, pedir fiscalização preventiva da constitucionalidade ao Tribunal Constitucional ou vetar. O Presidente tem recusado tomar posição sobre o assunto, embora se saiba que foi voluntário de cuidados paliativos e será contra. Publicamente e já como Chefe do Estado, tem dito apenas que se pronunciará quando chegar a hora.
 
 
Texto: Cláudia Sebastião
Fotos: Ricardo Perna e pixabay

 
Continuar a ler