A Federação dos Centros de Preparação para o Matrimónio (CPM), organismo da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) encarregue da preparação para o matrimónio em Portugal, divulgou os dados referentes ao ano pastoral de 2015/2016, que mostram que menos de metade dos casais que se casa pela Igreja em Portugal faz uma preparação oficial.
Segundo a Federação, foram 3481 os casais que frequentaram as formações nos 132 centros ativos em todo o país. Em Portugal, e segundo dados da PORDATA, o número de casamentos católicos em 2015 foi de 11.512, o que significa que menos de metade dos casais frequentaram estas formações. «Temos consciência desta realidade e queremos apresentar propostas à comunidade», diz Joaquim Valente, que, com a mulher Diná, foram eleitos para liderar a Federação dos CPM em novembro.
Apesar de ir dizendo que existem algumas congregações e movimentos com equipas de preparação para o matrimónio, reconhece que o número será «pouco maior» que este, e acusa os párocos de não estarem sensíveis para esta temática. «Nós não temos culturalmente assumido que temos de nos preparar para um projeto de vida. Hoje é-se pai, mãe ou casal sem preparação. Depois, os nossos líderes espirituais não têm essa sensibilidade. Não há preparação para o batismo, para o matrimónio, e por aí fora. Precisamos que os sacerdotes que recebem os noivos para começar a preparar a documentação do casamento estejam sensíveis para esta questão, e não temos isso», lamenta o responsável pela Federação.
Joaquim Valente não percebe como é que «é esta a rede que a Igreja em Portugal apadrinha», mas que depois «não apresenta» na prática, mas acredita que isso está a mudar. «Tem sido um trabalho que temos estado a fazer junto da Comissão Episcopal do Laicado e Família, e estou convencido que as coisas estão diferentes, o ano de 2016 trouxe muita coisa que está a provocar mudança, e acreditamos que este caminho que o CPM está a propor à Igreja vai dar os seus frutos», considera.
Até porque, diz este leigo, «quando os párocos fazem uma primeira assistência de uma equipa de CPM e percebem o valor que tem para a caminhada daqueles noivos, reconhecem que é uma grande ajuda, tanto para os casais que dão a formação como para os noivos».
«Não podemos ter uma boa pastoral familiar se não tivermos uma boa preparação para o matrimónio»
Durante muito tempo, tem sido prática generalizada a preparação rápida e superficial para o matrimónio. Geralmente o CPM tem lugar num fim-de-semana, ou em uma ou duas reuniões à noite. “Os noivos não querem mais” é a razão que habitualmente se ouve. Mas algo está a mudar, segundo Joaquim Valente. «A preparação deve começar o mais antecipadamente possível. Dizemos em tom de piada que marquem o CPM quando marcam a quinta para o copo de água», considera, antes de explicar que a proposta da Federação, em termos ideais, é mesmo a de espaçar e de começar «um ano antes, com seis reuniões espalhadas». «É assumido pela generalidade dos centros esta prática, mas há centros onde temos de atender à sua especificidade. Em Lisboa temos várias realidades: paróquias muito viradas para jovens universitários, que terão dificuldades numa formação com tanto tempo, embora às vezes sejamos surpreendidos».
Na verdade, explica Joaquim Valente, «o CPM não impõe prazos». «Impõe que seja num espaço de tempo que permita a reflexão e diálogo entre os noivos e o amadurecimento das temáticas no seu projeto de vida em casal. Uma grande percentagem dos centros faz isto, mas há alguns que fazem só num fim-de-semana porque não há tempo de fazer como deve ser, e não é por aí que queremos apontar, queremos uma caminhada de amadurecimento e reflexão», refere.
Esta preparação pode fazer recuar nas intenções alguns dos noivos que aparecem para se casar pela Igreja, mas o responsável pela Federação do CPM não acredita que assim seja. «Se os padres, ao acolherem os noivos, fizerem propostas claras e convictas, percebendo as dificuldades que possam ter, porque nem todos estão em casa à sexta-feira ou ao sábado, penso que esta proposta do CPM vai ser bem acolhida», considera.
Uma das razões para pensarem isto tem a ver com o feedback que vão recebendo de quem faz este percurso. «O feedback dos noivos é “Ah, eu não sabia que isto era assim”, “vale mesmo a pena”, “que pena terminar agora”. O problema é quando temos párocos a falar do CPM sem nunca terem tido uma experiência de CPM, sem nunca terem acompanhado uma equipa CPM e ver o que essa equipa pode dar aos noivos e o que esses noivos podem ser para a comunidade», avisa.
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A solução não passa por «obrigar» à frequência do CPM, mas Joaquim Valente sempre vai dizendo que se «é importante aprender o código da estrada antes de tirar a carta», então que também é importante a preparação para este «projeto de vida» que é o matrimónio.
Cerca de um ano depois da publicação da exortação apostólica
Amoris Laetitia, Joaquim Valente considera que esta veio «espicaçar», e que é preciso «estar disponível para pôr em prática muita da coisa que ali está», numa aposta clara na pastoral familiar, à qual o CPM se associa por inerência. «Não podemos ter uma boa pastoral familiar se não tivermos uma boa preparação para o matrimónio. Nós sentimos o peso dessa responsabilidade, e sabemos que, se este trabalho for bem feito, tudo o resto será diferente, e iremos ter uma sociedade diferente», considera.
Neste sentido, a proposta do CPM quer passar por integrar os noivos nas comunidades durante o tempo de preparação. «O CPM vê toda esta preparação no sentido de os casais poderem dar e receber na sua comunidade, sendo uma mais-valia para ela. Quando fazemos o acolhimento dos noivos para o CPM, e continuamos a acompanhar nos primeiros tempos de vida de casados, queremos acompanhar para eles se integrarem na comunidade, e fazemos questão de os apresentar num âmbito de uma pastoral familiar que os acolhe e os valoriza», sustenta.
Uma «proposta de caminhada», mais do que uma «chave para o sucesso», que é algo que, diz Joaquim Valente, os jovens procuram. «Os jovens aparecem-nos muito a pedir este tipo de formação. A sociedade está carente de quem lhes fale destas coisas e desta grandeza que é o sacramento do matrimónio vivido num amor de doação, de comunhão, de respeito pelo outro. Isto não é utopia, mas temos de trabalhar nisso. Hoje as pessoas procuram essa caminhada, porque a proposta que fazemos é de crescimento, de irem amadurecendo, dialogando, construindo», conclui.
Por isso, o trabalho desta nova equipa à frente da Federação passará por «esticar o CPM às dioceses onde ainda não chega e sensibilizar os párocos para a sua importância». «Queremos arrancar rapidamente nas dioceses que querem e ainda não conseguiram. O mais possível, fazermos pontes com outros movimentos para que possamos, antes e depois, entregar os casais novos e eles se sintam acolhidos noutras dinâmicas de pastoral familiar. E antes, que o CPM não seja apenas um bilhete de comboio, mas venham com uma predisposição para a caminhada», pede.