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Moçambique: distribuição de comida a população é «tarefa muito complicada»
26.03.2019
O superior dos padres espiritanos em Moçambique, o Pe. Alberto Tchindemba, faz um retrato preocupante da situação atual em Moçambique. O sacerdote está na cidade de Nampula, e relata a situação que lhe foi transmitida pelo responsável espiritano na Beira, referindo que o mais preocupante é a «fome» e a ganância dos comerciantes locais. «Há muita fome. O povo anda à procura de comida. Os que têm em sua posse alguns víveres vendem-nos a preço especulativo. Nota-se uma subida vertiginosa de preços até nos transportes públicos. Há comerciantes que se aproveitam da situação de grande penúria para explorar os outros», relata este religioso.

 
No que diz respeito à assistência à população, os relatos que lhe chegam da Beira falam de uma «tarefa muito complicada» e conta o sucedido num dos pontos de distribuição há poucos dias. «O atraso do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades na distribuição dos bens de primeira necessidade fez eclodir uma conclusão no seio das pessoas. Por exemplo, num dos centros de distribuição de água e de arroz houve muita confusão da parte da população. O povo esperou e cansou-se de esperar e, quando chegou o momento de distribuição da comida, todos foram contra os «distribuidores». Um outro caso deu-se num dos armazéns que tinha alguma reserva de comida. A população pura e simplesmente assaltou o armazém e cada pessoa levou o que podia levar», contou.
 
Os relatos que chegam da Beira falam ainda de muitos desaparecidos. «A subida das águas do rio provocou muito pânico no meio da população, o que fez com que cada um fugisse para o seu lado. Muitos são tidos como desaparecidos», refere o sacerdote. Aliás, no que diz respeito a portugueses, há ainda sete que estão incontactáveis, segundo referiu o Ministério dos Negócios Estrangeiros português.
 
Referindo que «grande parte das igrejas da cidade sofreu alguma destruição», o Pe. Alberto destaca que na Beira a preocupação dos sacerdotes está mais com as populações, pois têm aumentado os «desacatos entre pessoas dos bairros». «Durante o ciclone, muitas chapas de zinco (para a cobertura das casas) saíram dos telhados e caíram na terra ou na casa do vizinho ou simplesmente desapareceram. No fim da tragédia, as pessoas começaram a procurar as suas chapas e muitas vezes encontram-nas no telhado do vizinho. A pessoa que descobre as suas chapas na casa do vizinho, luta a ferro e fogo para os conseguir, e aquele que os roubou ou apanhou e utilizou não aceita que fique sem chapas. É aqui que começam as discussões e lutas», refere.
 
Neste momento em que muitos procuram ajudar o país, o Pe. Alberto afirma que «em todo o país sente-se uma solidariedade jamais vista em relação às vítimas do ciclone», mas destaca que a questão de fazer chegar os bens à população é uma preocupação. «A questão dos bens à população é um dos grandes desafios. Fazer chegar os bens ao mais pobre àquilo a que tem direito é o desafio daqueles que estão metidos no serviço de apoio às pessoas. Aqui podíamos dizer que a Caritas de cada Diocese e Paróquias teriam, na minha modéstia opinião, mais possibilidades de fazer chegar as ajudas àqueles que precisam».
 
Já ontem, o responsável pela Cáritas portuguesa, Eugénio da Fonseca, falava neste problema. «Não há armazéns em quantidade suficiente e há o risco de se perder» a comida que se envia de longe, pelo que a preferência na ajuda são mesmo os donativos em dinheiro para que as organizações no terreno possam adquirir os bens, evitando que os mesmo se percam e permitindo que o dinheiro que se iria gastar a enviar daqui contentores possa servir para adquirir ainda mais bens.

 
Texto: Ricardo Perna
Foto: Karel Prinsloo/Unicef
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