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«Não se pode ler a Exortação desvinculada do Documento Final»
23.04.2020
A Ir. Irene Lopes, secretária-executiva da REPAM (Rede Pan-Amazónica), uma das organizações envolvidas na preparação do Sínodo dos bispos para a Amazónia, foi a única mulher presente na comissão preparatória do sínodo e faz, para a Família Cristã, uma avaliação «muito psitiva» da exortação do Papa Francisco para a Amazónia. «Querida Amazónia», como é chamada, aponta caminhos e, segundo esta responsável, não deixa de lado o Documento Final do Sínodo, onde estavam alguns dos assuntos mais polémicos.

Foto ©REPAM/Brasil
Que balanço faz do documento do Papa?

Avalio de forma muito positiva a Exortação “Querida Amazónia”. Para nós, que particámos ativamente no processo sinodal, ela responde prontamente ao que vivemos e aproxima-nos muito do Papa Francisco, quando ele carinhosamente se refere à Amazónia. Sabemos que o documento é um tanto amplo e por isso parece não atender aos grandes anseios que foram massivamente divulgados. Porém, ele coloca-nos em marcha, no caminho sinodal que ainda não terminou, quando Francisco, já nas primeiras linhas, recomenda a leitura e aprofundamento do Documento Final, reforçando que é lá que estão as questões fundamentais que tocam a vida das comunidades e que, de facto, e juntamente com a Exortação, devem ser acolhidas e vividas nos territórios.

Como foi o documento recebido aí, na Amazónia?
Recebemos com muito entusiasmo e alegria. Já quando vimos o título da Exortação, mais uma vez nos surpreendemos com o Papa Francisco, que assume a língua do Sínodo e de forma tão afetuosa se dirige à Amazónia. Estávamos ansiosos porque sabemos que o Sínodo não terminou, estamos apenas na sua terceira fase e, para isso, precisávamos da palavra do Papa, que tanto nos ouviu no Sínodo, para seguir a nossa trajetória. Enquanto Rede Eclesial Pan-Amazônica/REPAM-Brasil, estamos muito felizes e acolhemos com muita vontade de seguir adiante para tornar real os sonhos de Francisco para a Amazónia.

Considera que foi ao encontro das expetativas dos participantes no Sínodo?
Com toda a certeza que sim. Francisco ouviu os clamores dos povos da Amazónia e solidarizou-se com eles. Temos uma palavra forte do Papa no que diz respeito às denúncias acerca da realidade vivida na Pan-Amazónia, além de um olhar afetuoso para a Igreja naquele território.

A exortação do Papa tem muito sonhos mas poucas concretizações. Ficou desiludida com o documento?
Não nos desiludimos, muito pelo contrário, temos certeza de que a missão continua e, agora, depois da assembleia sinodal, com muito mais intensidade e compromisso dos territórios. A Exortação aponta-nos os sonhos e para concretizá-los precisamos de ações concretas, que já estão pautadas nas conversões apontadas no Documento Final do Sínodo, mencionado pelo próprio Papa em “Querida Amazónia”. Os dois documentos complementam-se e apontam-nos os novos caminhos.

Foto ©Vatican Media
O facto de não ter apresentado o Documento Final como magistério retira força ao documento?
Para os territórios não. Sabemos os sonhos do papa Francisco e o que a assembleia sinodal nos apontou. A Igreja faz-se no território com os sonhos e a partir da realidade que lá está presente. A força do documento é torná-lo vida na vida das pessoas e na Igreja da Amazónia.

Quais são os pontos mais positivos da exortação e que, na sua opinião, mais vão permitir os «caminhos novos para a Amazónia» que pedia na entrevista que fizemos antes do Sínodo?
Essa é uma questão bastante complexa, dada a diversidade da realidade da Amazónia. Em cada um dos sonhos temos pontos significativos que se tornam necessários em diferentes realidades. Acredito que, no sonho social, por exemplo, temos muitos elementos que nos ajudam numa tomada de consciência da realidade e a avaliar profeticamente os desafios que a Pan-Amazónia enfrenta, em vista de uma maior consciência e posicionamento. No sonho cultural, recuperamos o cuidado para com a nossa identidade e as nossas raízes, com o convite a compreendermos e vivermos de forma mais harmoniosa a interculturalidade e no cuidado às nossas culturas. No sonho ecológico temos o grito da Amazónia e a coerência com a Laudato si na perspetiva do cuidado com a nossa Casa Comum. No sonho eclesial, o mais comentado entre eles, vemos as perspectivas e caminhos para a Igreja com rosto Amazónico.  E algo que precisa ficar claro: não se pode ler a Exortação desvinculada do Documento Final. São dois textos que se entrecruzam e se complementam. Não se pode concretizar os sonhos se não se viver, antes, as conversões.
 
Entrevista: Ricardo Perna
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