Precisa de ajuda?
Faça aqui a sua pesquisa
O seu filho dorme bem?
09.09.2016
Os estudos mais recentes acerca do sono de crianças e adolescentes apontam para resultados preocupantes: mais de 50% dos estudantes têm sonolência excessiva durante o dia e mais de 80% não dormem oito horas. Mas afinal o que se passa com o sono das crianças?


 
Teresa Paiva, Helena Rebelo Pinto e Teresa Rebelo Pinto – do CENC, Centro de Eletroencefalografia e Neurofisiologia Clínica Dr.ª Teresa Paiva – criaram o projeto SonoEscolas, em 2010, para educar e prevenir. Fizeram centenas de sessões em escolas de todo o país e estudaram o sono dos alunos. Helena Rebelo Pinto, psicóloga e professora catedrática de Psicologia na Universidade Católica, explica que «permitiram construir alguns instrumentos para avaliar características do sono das crianças e adolescentes. Ao mesmo tempo, construímos um modelo teórico de enquadramento. Agora estamos preparados para publicar material pedagógico que sirva de apoio aos professores».
 
Nos contactos com docentes havia queixas recorrentes: os alunos tinham muito sono durante o dia, especialmente nas aulas da manhã e desvalorizavam a importância de dormir. Havia também mais hábitos. «A maior parte utilizava tecnologias à noite ou deitava-se muito tarde ou tinha insónia ou problemas de sono que não estavam tratados nem identificados», explica a psicóloga Teresa Rebelo Pinto.
Teresa Rebelo Pinto e Helena Rebelo Pinto trabalharam o sono em escolas.

Ao consultório da neurologista Teresa Paiva, chegam cada vez mais crianças e jovens com perturbações de sono. Alguns têm poucos meses de vida. O trabalho é multidisciplinar, com ajuda da psicologia e envolve as famílias. Começa-se sempre por ver se há doença orgânica ou psicológica. «A grande diferença é que, quando é psicológico ou comportamental, fica resolvido com passear ao colo, levar para a rua, embalar no carro, meter na cama, etc.» Mas há doenças orgânicas. «Muitas crianças têm apneias do sono e outras não dormem porque têm refluxo esofágico, determinadas alergias ou doenças graves. Todas as doenças do desenvolvimento ou doenças genéticas dão geralmente alterações gravíssimas do sono.» Além disso, há os terrores noturnos, o sonambulismo, o fazer xixi na cama, ranger dos dentes e insónias. «Uma criança que desenvolve uma insónia na idade jovem vai ter maior risco de ter insónia mais tarde e de ser um adulto com maior risco de depressão e de incapacidade de gerir os seus assuntos e tomar decisões.»

 
Catarina Mestre, psicóloga, acompanha crianças.Da parte orgânica trata Teresa Paiva, da parte psicológica, Catarina Mestre. «As consultas que eu faço estão muito ligadas aos medos das crianças, às ansiedades, além das disrupções dos horários familiares», explica a psicóloga. Para lidar com os medos, há técnicas de relaxamento para «ajudar as crianças a autocontrolar-se, sem estar sempre a solicitar a presença dos pais». Além desse, há outros objetivos. «Televisões, Ipads, computadores, telemóveis… os miúdos parece que nascem com isso na mão. Eles não sabem estar sozinhos ou quietos sem estar a receber estímulos externos constantemente», constata. O relaxamento «ensina a olhar para dentro, a tomar atenção ao corpo, a prestar atenção aos sentimentos, às sensações».

Hábitos que criam doenças
Podem os maus hábitos comportamentais provocar doenças do sono? Teresa Paiva admite que sim. «Dormir pouco em idade jovem é como se estivesse a agredir um cérebro, que vai evoluir agredido.» Dormir tarde faz os relógios biológicos deslizar. Esta médica lembra uma criança de três anos que se deita às 23h00. «Quando tiver quatro ou cinco anos vai para a cama à meia-noite. Quando tiver seis ou sete vai para a cama à uma e quando chegar ao fim da adolescência vai para a cama às seis ou sete. Temos casos assim, de se deitar às nove da manhã!» Resolver estes “atrasos de fase” é difícil, demora e não há garantias de sucesso.

A neurologista trabalha na área do sono desde 1983 e continua a aprender e estudar. «Fiz um exame europeu para sonologista europeu com sessenta e sete anos de idade. Sou considerada uma avó do sono europeia. Sou a sleep grandmother.» Quanto mais experiência tem, mais se convence que cada caso é um caso e que o sono é essencial para a saúde. «O sono põe em equilíbrio todas as partes do corpo, desde o cérebro que é considerado um dos maiores beneficiados. Se não dormirmos bem, começamos a ter mais faltas de memória, acidentes; temos o risco de ter mais doenças de origem central como a depressão ou a insónia; e temos um risco importante de alterações de humor.» Teresa Paiva explica que o sono controla vários metabolismos. «A privação de sono aumenta o risco de diabetes, aumenta o risco cardiovascular, de hipertensão arterial, de arritmias cardíacas, de AVC.» Mas há mais: a privação de sono pode prejudicar o crescimento, o equilíbrio imunológico e «aumenta o risco de determinados tipos de cancro, como o da mama, do útero, da próstata».

Teresa Paiva é considerada a "avó do sono" europeia.
Teresa Rebelo Pinto, psicóloga, acompanha adolescentes no CENC. Problemas principais: sono a menos, grande variação de horários e falta de rotinas. «Em 2012, fizemos um estudo com jovens dos doze aos dezoito anos, e, nos dias de semana, 85% dos alunos dormia menos de oito horas. 85%! E esses hábitos agravam-se com a idade e agrava-se a diferença entre semana e fim de semana.»
Dormir pouco e mal tem consequências também no rendimento escolar. «Nos adolescentes, o insucesso escolar nas matérias abstratas ou a falta de criatividade estão muito associados à privação ou a perturbações de sono.»

Quais são os sinais de alerta?
Fonte: Teresa Rebelo Pinto


Como mudar maus hábitos?
Se acha que pode haver uma perturbação, recorra a um médico especialista do sono. Se são ainda “apenas” maus hábitos, comece por afastar as atividades estimulantes da hora de dormir. «As tecnologias são estimulantes, quer seja pela luz, que é o principal sincronizador do nosso ritmo sono-vigília, quer porque estimulam do ponto de vista cognitivo ou emocional», explica Teresa Rebelo Pinto. Para dormir é preciso serenar, acalmar e “desligar”, mas também sentir-se seguro. «O que dá segurança? A rotina, os horários, saber quando as coisas estão a desligar, saber que não estamos ali no quarto, mas no quarto ao lado», afirma a psicóloga.
 
Com os jovens a palavra-chave é responsabilizar. «A primeira coisa que os adolescentes perguntam é: “Nunca mais posso sair à noite com os meus amigos?” O que se faz é ensinar a autorregulação. Em vez de saírem quinta-feira, sexta e sábado até às tantas, escolhem um dia e definem uma hora para voltar. No dia seguinte, não dormem até às seis da tarde.»
 
Reportagem publicada na FAMÍLIA CRISTÃ de setembro de 2016.
Texto e fotografias: Cláudia Sebastião, Isa Pinto e FreeImages
Continuar a ler