O Papa Francisco esteve hoje em vigília com os jovens que estão a participar na XXXIV Jornada Mundial da Juventude que decorre no Panamá. Num momento já tradicional nas Jornadas, o Papa dialogou de forma longa com os jovens, cujos testemunhos o interpelaram.
Recorrendo as analogias mais modernas das redes sociais, o Papa Francisco começou por explicar que Maria foi «influencer de Deus». «Com poucas palavras, soube dizer “sim”, confiando no amor e nas promessas de Deus, única força capaz de fazer novas todas as coisas», disse o Papa.
A coragem da mãe de Deus, afirmou o Papa, foi o «sim» de quem «quer apostar tudo, sem ter outra garantia para além da certeza de saber que é portadora de uma promessa», sabendo que «o desejo de servir» foi «mais forte do que as dúvidas e as dificuldades».
O valor da vida, mesmo com deficiência
O primeiro testemunho veio de Erika de Bucktron, membro de uma família do Panamá. Uma das suas gravidezes resultou anembrionária, sem embrião, e a última gravidez, aos 42 anos, resultou numa filha com Síndrome de Down. Esta mãe afirmou ao Papa que há pais que «acham difícil aceitar a chegada de um bebé com uma doença ou deficiência».
Quando falou, o Papa elogiou a postura de Erika e Rogelio, seu marido, porque acreditaram que «o mundo não é só para os fortes». «Porventura alguém, pelo facto de ser portador de deficiência ou frágil, não é digno de amor? Porventura alguém, pelo facto de ser estrangeiro, ter errado, encontrar-se doente ou numa prisão, não é digno de amor? Assim fez Jesus: abraçou o leproso, o cego e o paralítico, abraçou o fariseu e o pecador. Abraçou o ladrão na cruz, abraçou e perdoou até àqueles que O estavam a crucificar», afirmou o Papa.
De seguida, Francisco afirmou, a uma só voz com os jovens, que «só o que se ama pode ser salvo». «O amor do Senhor é maior que todas as nossas contradições, fragilidades e mesquinhices, mas é precisamente através das nossas contradições, fragilidades e mesquinhices que Ele quer escrever esta história de amor. Abraçou o filho pródigo, abraçou Pedro depois de O ter negado e abraça-nos sempre, sempre, depois das nossas quedas, ajudando-nos a levantar e ficar de pé. Porque a verdadeira queda, aquela que nos pode arruinar a vida, é ficar por terra e não se deixar ajudar».
Os perigos da droga
Alfredo Andrión também é do Panamá e tem uma história ligada à droga e à falta de oportunidades. Preso por causa da droga, tentou mudar a sua vida, mas «sem ajuda profissional voltei à droga» e até a família o rejeitou, até que encontrou uma resposta na Fundação São João Paulo II, que o apoiou e ajudou a reabilitar.
O Papa ficou «impressionado» com o testemunho, e lamentou os quatro S que «deixam a nossa vida sem raízes»: «sem trabalho, sem instrução, sem comunidade, sem família». «É impossível uma pessoa crescer, se não possui raízes fortes que a ajudem a estar firme de pé e agarrada à terra. É fácil extraviar-se, quando não temos onde firmar-nos», afirmou.
Por isso, exortou os jovens a questionarem os adultos sobre as raízes que estes lhes estão a deixar. «Como é fácil criticar os jovens e passar o tempo murmurando, se os deixamos sem oportunidades laborais, educativas e comunitárias a que agarrar-se para sonhar o futuro! Sem instrução, é difícil sonhar o futuro; sem trabalho, é muito difícil sonhar o futuro; sem família nem comunidade, é quase impossível sonhar o futuro. Porque sonhar o futuro é aprender a responder não só porque vivo, mas também para quem vivo, por quem vale a pena gastar a vida».
Francisco falou da «cultura do abandono e da falta de consideração» de que sofrem muitos jovens nos dias de hoje, que os leva a questionar tudo, inclusive a existência de Deus. «Não digo todos, mas muitos [jovens] sentem que não têm nem muito nem pouco para dar, por falta de espaços reais que a isso os convoquem. Como hão de pensar que Deus existe se, para seus irmãos, há muito que deixaram de existir?», questionou.
A forma como a JMJ serve para dar um «salto de fé»
O último testemunho ficou a cargo de Nirmeen Odeh, um jovem cristão da Palestina que se tinha afastado da sua fé por causa dos problemas que existem em Israel. Depois de participar na JMJ de Cracóvia, em 2016, reaproximou-se da fé e fez a Primeira Comunhão, tudo porque entendeu que «Jesus me amava por quem eu sou, com todas as minhas falhas».
A este jovem, o Papa dirigiu uma palavra de apreço porque encontrou «uma comunidade viva, alegre, que veio ao encontro» dele e lhe permitiu viver a «alegria que comunica a maravilha de ser encontrado por Jesus».
O Papa Francisco explica que o «Evangelho ensina-nos que o mundo não será melhor por haver menos pessoas doentes, debilitadas, frágeis ou idosas de que ocupar-se, nem por haver menos pecadores, mas será melhor quando forem mais as pessoas que, como estes amigos, estiverem dispostas e tiverem a coragem de dar à luz o amanhã e acreditar na força transformadora do amor de Deus».
Por isso, questionou os jovens presentes se queriam ser influencers ao jeito de Maria, pessoas que o Papa definiu como sendo, no século XXI, «guardião das raízes, guardião de tudo aquilo que impede a nossa vida de tornar-se “gasosa”, evaporando-se no nada». «Sede guardiões de tudo o que permite sentir-nos parte uns dos outros, pertencer-nos mutuamente», concluiu.
No final do discurso teve lugar a Adoração Eucarística, participada pelo Papa, cujo relicário foi construído utilizando balas que evocaram a violência que tem assolado a América Latina. Um momento de silêncio e reflexão apenas cortado por alguns cânticos que ecoavam pelo recinto. No final, o Papa rezou diante da Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima, que depois foi transportada em procissão por jovens até uma carrinha, iniciando aí um percurso de visita ao Campo S. João Paulo II e a todos os peregrinos presentes.
Hoje, sábado, os jovens permanecem toda a noite no campo, a aguardar pela Missa conclusiva de amanhã, que será presidida pelo Papa Francisco.
Texto: Ricardo Perna
Fotos: Jornada Mundial da Juventude
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