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Patriarca quer «católicos a sério» no mundo
09.12.2016
O Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, assinou ontem a Constituição Sinodal de Lisboa, o documento de trabalho que resultou da assembleia sinodal que esteve reunida na passada semana. O momento aconteceu no final da celebração onde foram ordenados o Pe. Fredy Moreno, sacerdote paulista, e cinco diáconos.
O documento foi posteriormente entregue a alguns sacerdotes e a toda a comunidade presente no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa.

São 70 pontos que refletem o pensar de milhares de pessoas do Patriarcado sobre a sua diocese. «O que lá está é o fruto desta reflexão, que diz que as comunidades cristãs, a começar pela comunidade das famílias cristãs, mas as paróquias, institutos, movimentos, é uma rede tão densa de cristãos a quem pedimos que reúnam para fora. Que percebam que o significado que o Evangelho dá às suas vidas tem de ser oferecido, porque alguém lhes ofereceu a eles», referiu aos jornalistas no final da celebração.
 
D. Manuel Clemente afirma que esta mensagem é para quem quer «levar a sério» a sua condição de católico. «Os sacerdotes e toda a comunidade cristã são chamados a estar com todas as pessoas, são 2,5 milhões de pessoas e não podem ser 300 sacerdotes sozinhos a fazer esse trabalho. Quem está nas empresas, nas escolas, nos hospitais, que queira ser católico a sério, está na primeira linha para mostrar aos outros, com simplicidade, mas com generosidade, aquilo que lhe dá esperança».
 
Esta fase, a da «receção» do documento, será a que poderá demorar mais. O Cardeal-Patriarca de Lisboa espera que seja mais rápida que a do último sínodo, que aconteceu há quase 400 anos. «Temos instâncias de reflexão que temos de ativar e melhorar, quer nas paróquias, quer na diocese. Na diocese é o Conselho Pastoral, onde estão representantes de todas as realidades religiosas da diocese; depois o Conselho Presbiteral. Mas também nas paróquias é preciso ativar os Conselhos Paroquiais, com representantes de todos os movimentos da paróquia. O que propus foi que, ciclicamente todos os anos, peguemos no texto e vejamos, paróquia a paróquia, comunidade a comunidade: “isto avançou? Não avançou porquê? Esta opção andou para a frente? O que falta?” Fazendo isto ciclicamente, estaremos mais presentes na realidade», defendeu.
 
Um documento crítico da realidade
O documento distribuído e que agora será alvo de receção em toda a diocese está dividido em 70 pontos, nos quais se faz um retrato da realidade, apontando as fraquezas existentes.
No ponto 15, refere-se a «descoordenação pastoral e multiplicação de propostas que tendem a dispersar esforços e recursos; organização territorial das paróquias nem sempre ajustada às necessidades das comunidades; tendência para privilegiar o particular e o imediato em detrimento de uma pastoral de conjunto e de continuidade», enquanto que, no ponto seguinte, se aponta «os vários encargos» com que os sacerdotes «estão sobrecarregados», apelando-se à necessidade de «crescer na capacidade de gerar uma maior dinâmica de corresponsabilidade com os leigos».
 
Os participantes no sínodo diocesano apontam ainda os «sintomas de desencontro entre os desejos sinceros de formação e as propostas formativas disponibilizadas», defendendo que «às comunidade cristãs cabe a tarefa de proporcionar ambientes motivadores, acolhedores e fraternos que promovam o acompanhamento espiritual e a formação cristã dos fiéis leigos (...), atendendo aos seus horários laborais e à vida familiar», conforme se lê no ponto 18.
 
O documento aponta ainda a «insuficiente participação dos cristãos católicos noutros domínios da vida social e política», e o «longo caminho» que ainda falta às famílias da diocese percorrerem para serem «verdadeiras igrejas domésticas».

Passos para o futuro pensados, mas poucas indicações práticas
Depois de retratar a realidade que é necessária mudar, a Constituição Sinodal de Lisboa aponta alguns caminhos, embora não determine ações muito concretas. Definindo «oito critérios de discernimento e ação eclesial», rejeitam «o cómodo critério pastoral do “fez-se sempre assim”». «Com efeito, nem sempre os cristãos têm sabido vencer a inércia e a acédia pastoral», pode ler-se no ponto 33.
 
No sentido de «fazer da palavra de Deus o lugar onde nasce a fé», o sínodo sugere que as comunidades promovam «a leitura orante da Escritura e a formação bíblica», dando um especial destaque à importância da homilia, que é, «para muitos cristãos», «o momento evangelizador por excelência». «Requer-se preparação e não improvisação; que interpele a vida da comunidade cristã e conduza ao mistério que se celebra».
 
O ponto 39 apela à promoção de «um verdadeiro acolhimento» de todas as pessoas da comunidade, enquanto que no ponto seguinte encontramos a «prioridade» que deve ser a «organização do catecumenado de jovens e adultos», a «organização da catequese das crianças, seguindo um modelo catecumenal com envolvimento familiar», que «abram à dimensão experiencial e comunitária da vida cristã».
 
Para isto, consideram os participantes do sínodo no ponto 43, é preciso «apostar na formação de comunicadores capazes de utilizar linguagens ajustadas aos desafios da comunicação neste tempo e, ainda, investira numa melhor articulação de meios, de modo a potenciar a comunicação da Igreja e na Igreja».

No que diz respeito à formação litúrgica das comunidades, aos sacerdotes é pedido que criem «momentos que disponham à escuta de Deus». Considerando que os «sacerdotes, consagrados e leigos» precisam de um «maior acompanhamento», «valorizam-se, neste contexto, a descoberta da vocação à santidade, no horizonte da própria fé como vocação; a iniciação à oração pessoal e comunitária; leitura e meditação da Palavra de Deus; o envolvimento em grupos de oração e participação em movimentos e novas comunidades; a vivência dos sacramentos da Reconciliação e da Eucaristia, bem como a adoração eucarística; a participação em retiros, exercícios espirituais, peregrinações e outras dimensões e práticas de cultivo da vida espiritual», conforme se lê no ponto 48.
 
A assembleia sinodal, que partiu das reflexões feitas por milhares de pessoas espalhadas pelo Patriarcado de Lisboa, pede que se convidem os pais das crianças que vão ser batizadas ou receber a Primeira Comunhão que aprofundem «o significado litúrgico e espiritual destes sacramentos, a celebrá-los na comunidade cristã e a integrar-se na mesma».
 
Fala-se ainda de criar, nas instituições sociais da Igreja, «espaços de acolhimento, escuta e reflexão» e uma «maior preocupação com as necessidades espirituais das pessoas», de «cuidar (...) da sua identidade cristã e da formação dos seus principais agentes», dando-lhes a conhecer os «princípios da fé cristã e da Doutrina Social da Igreja».
 
Os participantes do sínodo querem também «formar grupos de crentes que releiam a vida pessoal e comunitária à luz do Evangelho» e transformar «os espaços eclesiais habituais, tornando-os mais fraternos e acolhedores, partilhar os recursos com paróquias próximas e dinamizar uma pastoral de conjunto», olhando sempre para a «colaboração entre os diversos ministérios e instâncias eclesiais». Esta será uma tarefas mais difíceis, considerando a dificuldade que algumas comunidades e pastores têm em trabalhar em conjunto, saindo da “sua quinta”.
 
Por isso, no final da celebração, D. Manuel afirmou que «as sete opções com que termina a Constituição são a opção de Deus, e por isso é a correspondência nossa à vontade de Deus. Acolhamos com o coração o que é o fruto de uma caminhada sinodal de dois anos e meio. Até aqui foi bom, a partir daqui, com Maria, será ainda melhor», defendeu.
 
Texto: Ricardo Perna
Fotos: Ricardo Perna e Patriarcado de Lisboa

 
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