No dia em que o documento final da assembleia pré-sinodal dos jovens, que está a acontecer em Roma, começou a ser votado pelos jovens, alguns deles estiveram à conversa com os jornalistas na Sala de Imprensa da Santa Sé.
Sandro Bucher foi um dos jovens presentes. Apresentou-se como ateu, e reuniu as preferências de grande parte dos jornalistas, que quiseram perceber como é que um ateu tinha vivido estes dias de assembleia pré-sinodal. Admite que ficou «surpreendido» quando um elemento da Conferência Episcopal da Suíça o abordou com o convite. «Disse-me que o Papa queria convidar pessoas de outras religiões, e pessoas sem fé, e fiquei contente por ser escolhido para representar essas pessoas», revelou aos jornalistas. Filho de pai católico e mãe protestante, a pouca prática religiosa dos pais levou-o a perceber que «o ateísmo é o caminho certo para mim». «Não sou anti-igreja de forma alguma, estou à procura de diálogo justo e objetivo, e foi por isso que fui escolhido», sustentou.
Ainda pensou que o tentariam converter, confessa. «Não... bom, talvez um pouco (risos), mas ninguém tentou converter o outro. Foi mesmo sobre aceitar as crenças de cada um. Não houve vergonha de falarmos sobre o que acreditamos», disse.
Sobre as reflexões, explica que houve muitos momentos «provocadores», sobre questões que tocam «os assuntos mais prementes da sociedade dos dias de hoje». «Fiquei contente por perceber que, apesar de não ser crente, tenho as mesmas questões que a juventude que é crente, e as mesmas preocupações», disse, acrescentando que «nós, ateus, queremos fazer bem no mundo e ajudar as pessoas também, e queremos ter diálogo com os crentes, para podermos criar uma unidade».
Agora que tudo está quase a terminar, revela que, mesmo não tendo colocado em causa aquilo em que acredita, mudou a sua opinião sobre os jovens da Igreja. «Não repensei as minhas crenças, mas melhorei claramente a minha opinião sobre os jovens católicos como um todo e a Igreja. São mais abertos do que eu esperava, e as minhas questões são as deles», afirma.
Mais de dez mil comentários online integrados nos trabalhos
Os trabalhos tiveram a participação, para além dos mais de 350 membros presentes na assembleia, de mais de 15 mil jovens que, através das redes sociais, «falaram dos seus sonhos». «A experiência de termos mais de 15 mil jovens a participar via redes sociais foi muito boa, porque os jovens sentiram-se protagonistas, e sentiu-se a gratidão ao Santo Padre e à Igreja de abrir esta porta», conta à Família Cristã Javier Ayala, um seminarista do Chile da congregação dos Legionários de Cristo.
Os mais de 15 mil jovens acompanharam e participaram nos trabalhos. Produziram mais de dez mil comentários, que foram todos lidos e pensados, garante Javier. «Garanto-te, porque estive na equipa, que foram lidos os mais de 10 mil comentários que foram lá colocados [nos grupos de Facebook criados para o efeito]. Foi um grande trabalho de síntese, mas foram ouvidos e há muitas linhas convergentes» com o que ia sendo falado pelos jovens nos grupos linguísticos.

E para onde é que essas «linhas convergentes» apontam? «Desde logo, os jovens falam da família. Depois, pedem referências, uma Igreja aberta e próxima, que os acompanhe. Eles querem ser acompanhados, e referiram-no claramente nas redes sociais. “Não queremos estar sós, temos muitos desafios neste mundo que queremos abraçar, mas não o podemos fazer sozinhos”, diziam alguns comentários. Alguns jovens dizem que não sabem onde vão, e pedem referências, e curiosamente dentro da Igreja, não só no Papa e bispos, mas outros mais próximos, humildes e abertos, que não apenas os sacerdotes e as religiosas», refere este seminarista.
Um acompanhamento próximo que implica, reconhece, muita formação e capacitação de quem acompanha. «É um desafio a formarmo-nos, a estarmos presentes de uma outra forma, a saber o que se passa nas redes sociais, no cinema, onde os jovens estão. Claro que é um desafio de formação, e é aí que estamos», reconhece. Até porque «muitos jovens pedem que se expliquem as coisas, sem medo». «A primeira coisa é não ter medo de falar, estar preparado para isso, e escutá-los».
Afirmação da doutrina social da Igreja
Leon Souza veio do Brasil para, na assembleia pré-sinodal, representar a Caritas Internationalis. Leva na bagagem de volta «uma renovação e uma esperança por causa das diversas experiências juvenis com que convivemos» e destaca a importância da «escuta» como uma das riquezas que retira dos trabalhos de grupo. «Uma Igreja que escute os jovens e reconheça as experiências dos jovens em vários setores. O Pré-Sínodo tem a presença de jovens cristãos, não cristãos e não crentes, e ouvir as várias experiências juvenis é muito importante», disse à Família Cristã.
Para isso, refere que «é preciso dar voz às experiências comunitárias dos jovens, porque é onde vivem a realidade e onde querem transformar. Na Cáritas, ou nos seus coletivos sociais, é importante que os jovens procurem e se organizem». Isto, no sentido de procurar a «formação integral dos jovens». Saber como é que formamos os jovens para o seu pleno desenvolvimento, que contemple todas as dimensões a partir da nossa fé. Como é que me coloco no mundo, na dimensão social e política. Depois, a dimensão do acompanhamento. Não no sentido de tutela, mas alguém que caminhe junto com os jovens», sugere.
Tudo isto e muito mais são coisas que não deixarão de estar no Documento Final, já conhecido em parte pelos jovens, que demonstraram todos muito cuidado em nada revelar. Leon garante que não houve «palavras proibidas de falar». «Falámos de todas as realidades juvenis, e o documento final vai apontar aí. São temas que falámos e que vão estar no documento final para que possamos aprofundar as realidades juvenis».
Os jovens estiveram nesta manhã a conhecer a proposta de Documento Final, e de tarde os pequenos grupos linguísticos irão debater alterações ao Documento Final, que será finalizado amanhã, sexta-feira, e apresentado para votação no sábado. «O documento está a ser aprovado por todos os jovens, não apenas por um grupo, em assembleia plenária. Não há formas perfeitas, mas é difícil encontrar um meio mais perfeito. As propostas foram feitas por eles, as expressões são deles, as palavras, as respostas, a síntese está a ser feita por eles. O documento que irá ser publicado sábado foi feito pelos jovens, desde a síntese inicial até ao documento final», assegura Javier Ayala.
Texto e fotos: Ricardo Perna
A FAMÍLIA CRISTÃ está em Roma a acompanhar todos os momentos desta reunião pré-sinodal do Papa com jovens de todo o mundo. Acompanhe tudo na secção especial do nosso site em http://familiacrista.paulus.pt/sinodo-dos-jovens.
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