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Pré-Sínodo: Jovens falam de tráfico humano, guerra e acompanhamento
20.03.2018
Numa altura em que os trabalhos nos grupos linguísticos da assembleia pré-sinodal estão na fase de redação dos contributos para o documento final, alguns dos participantes vieram até à Sala de Imprensa da Santa Sé para um encontro informal com os jornalistas. Uma oportunidade de conhecer mais em pormenor o sentir destes jovens que estão em Roma para ajudar na preparação do Sínodo dos Bispos marcado para outubro.

 
À conversa com a Família Cristã esteve Tiniyiko Joan Ndaba, representante mundial da rede Talitha Kum, que se debruça sobre a problemática do tráfico humano, um fenómeno global, «cujas maiores vítimas são os jovens», explicou à nossa revista.
 
Esta jovem ficou «muito entusiasmada» com as palavras do Papa Francisco no dia anterior, em que considerou como «crime» estes atos de abuso, principalmente porque deteta que alguns dos que o cometem dizem-se católicos. «O tráfico humano é um crime escondido, mas quando Papa disse que era um crime, fiquei muito contente com o apoio dele. É um crime que os cristãos também cometem, e isso é um problema, porque somos Igreja e devíamos levar o amor de Deus, mas se exploramos as pessoas mostramos o contrário. Estou tão contente que ele tenha falado nisso, porque me tocou o coração», revelou, com um sorrriso.
 
Tiniyiko revelou ainda que os trabalhos nos grupos linguísticos têm sido muito frutíferos, pois alguns dos jovens não se apercebiam da dimensão do problema do tráfico humano, um «crime contra a humanidade». «Os jovens nos grupos sabiam que existia tráfico humano, mas não sabiam o quão profundo era o problema. Ao partilhar, alguns diziam que o seu país não tinha tráfico humano, mas quando lhe perguntava se ele sabia onde tinha sido feita a t-shirt que estava a vestir, ele dizia que nunca tinha pensado dessa forma. Há muito a fazer para tornar as pessoas conscientes do problema», afirma.
 
Originário do Iraque, Shaker Youhanan Zaytouna é um cristão da igreja caldeia que entrou recentemente no seminário em Roma e está fazer a licenciatura em Teologia. Para este jovem iraquiano, que deixou o Iraque há alguns anos, não se pode em falar regressar os jovens ao Iraque. «Antes de mais, não há segurança, e o governo não nos pode pedir que regressemos, se não cria essas condições de segurança. Depois, a questão do trabalho, que também não existe. Se eu não tenho trabalho para garantir a sobrevivência da minha família, não vou voltar, e isto são problemas que têm de ser resolvidos», afirmou aos jornalistas. Uma solução que terá de passar pela Igreja, e do seu trabalho diplomático, mas que vai muito para além dela. Shaker considera que o trabalho pastoral que era feito com os jovens no Iraque tinha muito valor, e que os jovens iraquianos se perdem na Europa porque lhes falta «acompanhamento». «No Iraque, todos falávamos com o bispo, ele respondia-nos, e havia um grande acompanhamento dos jovens, e eles eram ativos. Aqui isso não acontece, e muitos afastam-se da Igreja», lamenta.
 
Este jovem seminarista considera que o trabalho pastoral que era desenvolvido com os jovens no Iraque tem um pré-Daesh e um pós-Daesh. «Antes da chegada do Daesh, tudo era mais fácil. Estávamos na rua até muito tarde, e acompanhávamos os jovens. Um padre podia sair de casa e ir com um jovem até casa dele, e não havia problema, porque lá nunca tivemos problemas de pedofilia. Mas hoje, com a guerra, os pais não deixam os filhos sair, há mais medo», defende.

 
Vinda da Polónia, Anna Kupiszewska está «maravilhada» com tudo o que tem encontrado nestes dias, e sente-se «fortalecida» com os testemunhos que tem ouvido. «O testemunho deles é maravilhoso, é fantástico que eles falem de como Deus opera na vida deles, em países onde não são a religião maioritária e têm outros problemas», diz. Um testemunho que pode servir de exemplo aos católicos que estão na Europa. «Aqui temos representantes de todo o mundo, há muitas diferenças, mas no fundo queremos as mesmas coisas, que é seguir Jesus. E acho que esta experiência podemos partilhar e dar-nos-á força na nossa vida do dia-a-dia», assegura.
 
«No fim desta reunião, todos levarão algo de novo para casa, e eu quero ouvir as experiências deles para perceber como é que o que ouço aqui me pode ser útil na Polónia, na nossa realidade», acrescenta, enquanto explica que nos grupos «escutamo-nos uns aos outros, respondemos às perguntas e depois debatemos muito, porque todos têm oportunidade de dizer algo, e discordar do que é dito».
 
No final, Anna quer assegurar aos responsáveis da Igreja que «os jovens estão na Igreja, que somos e nos sentimos responsáveis por ela». «Não temos medo de fazer o que a Igreja nos pedir, e estou grata pela experiência de Igreja que tenho no meu país», conclui.
 
Do México chega Corina Mortola, de 25 anos, uma licenciada em Marketing que é também atriz de teatro musical. É por isso com muito à vontade que vai respondendo às várias perguntas que lhe vão fazendo.
À Família Cristã, declarou que as partilhas estão a ser «dinâmicas, ativas e de muita informação e participação». «Todos os jovens estão a partilhar o que vivemos nos nossos países, e as nossas inquietações», diz, sorrindo. O que mais a tem surpreendido é a «caridade» que demonstram uns pelos outros.

Sobre a Igreja, espera que os bispos ganhem a força dos jovens. «Nós estamos identificados como tendo muita força, e é isso que esperamos passar aos bispos, a nossa força e a nossa presença», da parte de todos os jovens que aceitam este «convite» de viver o caminho da Igreja. «A nós fazem-nos um convite. O Papa pediu-nos que falássemos sem filtros, mas também que soubéssemos escutar, e ter uma escuta ativa. Ora se eu não gostar de algo, vou-me embora, mas se eu escutar muitas vezes, vou perceber que às vezes não tenho razão e vou compreender», e é esse o convite da Igreja.









 
Texto e Fotos: Ricardo Perna


A FAMÍLIA CRISTÃ vai estar em Roma a acompanhar todos os momentos desta reunião pré-sinodal do Papa com jovens de todo o mundo. Acompanhe tudo na secção especial do nosso site em http://familiacrista.paulus.pt/sinodo-dos-jovens.
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