05.07.2021
A pandemia marcou como se previa o semestre em que Portugal presidiu ao Conselho da União Europeia. E até mais do que se previa. A incerteza da recuperação continuará a marcar os próximos tempos e a avaliação das marcas destes seis meses terá de ser feita a longo prazo.
Foi só nos últimos dois meses que a presidência portuguesa do Conselho da União Europeu teve a visibilidade que o Governo lhe queria dar. Durante os primeiros meses foi como que assombrada pelos números de contágios e mortes por covid-19 em Portugal, que tornaram o país no pior da Europa quando o Governo tanto queria uma imagem positiva e de liderança.
De pior Portugal passou a melhor, mas agora volta a entrar em contraciclo com os restantes países europeus com as taxas de transmissão a subirem, apesar de a vacinação estar a correr a bom ritmo. Sinal de como ainda desconhecemos tanto sobre a covid-19 e de como continua a ser difícil prever e assegurar a retoma económica e social tão ansiada.
O grande momento sonhado pelo Governo para este semestre – a cimeira social do Porto – já foi possível ser realizado de forma presencial e as imagens de um Porto cheio de sol e de líderes europeus pareciam anunciar bons tempos. Da cimeira saíram três grandes metas para 2030: ter pelo menos 78% da população empregada, ter 60% dos trabalhadores a receberem formação anual e retirar do risco de pobreza e exclusão social 15 milhões de pessoas, entre as quais estão cinco milhões de crianças.
«Foi a primeira vez que Parlamento Europeu, Comissão Europeia e todos os parceiros sociais europeus assinaram um acordo social geral sobre emprego, formação e proteção social», salientava recentemente o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, em entrevista à Rádio Renascença e ao jornal Público. Numa avaliação deste semestre, Santos Silva colocava em segundo lugar a aprovação de todos os programas que materializam o quadro financeiro plurianual dos próximos sete anos e, em terceiro, a ratificação a decisão sobre recursos próprios da União Europeia (UE) por todos os estados-membros.
Contudo, houve quem achasse muito pouco retirar 15 milhões da pobreza quando há 90 milhões de cidadãos europeus em risco de exclusão social. Daí que a maior conquista da cimeira possa não ser a meta colocada, mas o facto inédito de ter colocado as instituições europeias e os parceiros sociais num compromisso conjunto.
E 2030 parece tão longe. Sobretudo se tivermos em conta que o fim da pandemia e dos seus efeitos ainda não está ali ao virar do semestre, apesar de os programas de recuperação e resiliência já estarem. Mesmo entre os socialistas, há quem, como o eurodeputado Pedro Marques, pense que o quadro financeiro já definido na UE não chegue, sobretudo quando as empresas deixarem de ter os apoios que ainda têm, através dos apoios ao lay-off e das moratórias.
A centralidade da pandemia acabou por deixar para segundo plano questões tão importantes como as alterações climáticas e o apoio aos refugiados. A aprovação, durante a presidência portuguesa, da primeira lei europeia do clima passou bastante despercebida. E, apesar de também ter sido concluído o primeiro ato legislativo sobre migração legal dos últimos cinco anos, o ministro Santos Silva assumiu alguma desilusão nesse campo.
«Não vamos tão longe quanto queríamos e a Europa precisava», disse o ministro dos Negócios Estrangeiros, que defende mais apoios para os chamados “Estados da linha da frente”, como a Itália, Grécia, Chipre, Malta e Espanha e também mais trabalho com os países de origem e de trânsito das migrações.
Deste semestre, numa perspetiva muito política, fica também a exposição europeia do primeiro-ministro e o alegado aumento das suas possibilidades de vir a ocupar um cargo europeu. Lá para 2023 havemos de perceber.