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Quem é esta iraquiana?
07.06.2016
Pascale Warda é uma mulher forte e determinada. Encontramo-nos para uma entrevista em Lisboa. Preparamos tudo para uma conversa que acaba por se prolongar por uma hora. Muito ficou por perguntar. Pascale é ativista no verdadeiro sentido da palavra. Empenhada, convicta, alguém que vive apaixonadamente o que a rodeia e, neste caso, os problemas das minorias e mulheres perseguidas no Iraque.
 

Família perseguida
Pascale Warda é iraquiana, católica caldeia e conhece as perseguições aos cristãos praticamente desde que nasceu. Na entrevista à FAMÍLIA CRISTÃ, conta que tinha apenas quatro anos quando a sua aldeia foi queimada. «A minha aldeia foi destruída completamente quatro vezes. O meu pai reconstruiu-a de todas as vezes. A minha casa foi a única na aldeia durante alguns anos, porque o meu pai resistia e dizia: “Não posso perder a terra dos nossos antepassados. Se abandonarmos a igreja, vão enchê-la de animais. Como vamos deixar a igreja?”» Mas a sua família foi também perseguida pessoalmente. O pai foi preso e torturado quando Pascale tinha nove anos. «Saiu da prisão seis meses depois. Não tinha unhas, tinham sido arrancadas, e ele tinha sido muito torturado.»

Na escola, a menina foi sendo pressionada para se inscrever no partido no poder até que abandonou a escola e acabou por ir estudar para França. Cursou Filosofia e Teologia. Mais tarde haveria de mudar de área e seguir Direitos Humanos, na Universidade Católica de Lyon. Mas antes disso, novo grande susto.


A vida em França
Em 1988, um bombardeamento químico atinge a aldeia onde a sua família vivia. Pascale, à distância e pela televisão, procura-a. «Eu procurava no Irão, na Turquia, na Síria, para ver se tinham saído por alguma fronteira. Um dia, o meu irmão liga à minha irmã que vivia em Bagdade e diz “eles estão vivos e na Turquia”.» Sem qualquer indicação concreta sobre o local onde se encontravam, Pascale apanha o avião, trata de todas as burocracias e consegue, finalmente, dez minutos com a família.

Depois de muitas lutas e da intervenção de Danielle Miterrand conseguiu reunir a família em França. Para ajudar, a jovem deixa os estudos e arranja dois trabalhos. Quando volta a estudar segue a área dos direitos humanos.

O amor ao Iraque
Cheia de pressa de regressar ao Iraque «que ama» faz dois anos de estudos num só e regressa. Encontra lá o homem que virá a ser seu marido e casa-se. Torna-se responsável de uma organização de mulheres assírias. Chega a ministra dos deslocados e refugiados. «Fui alvo de atentados cinco vezes. Caíram bombas na minha cadeira no escritório. Se lá estivesse teria morrido.» Um dos atentados marcou-a muito. «Quatro dos meus guardas costas foram mortos. Eu não estava com eles. Iam a minha casa buscar-me, pensaram que eu estaria com eles no carro. Os quatro foram martirizados…» A voz treme e os olhos brilham quando fala deste episódio.

Pascale Warda no funeral dos guardas assassinados.

Escolheu viver onde a quiseram matar
Ainda hoje se sente insegura em Bagdade, onde apesar de tudo escolheu viver. «Estamos mesmo sob proteção de Deus. Lembro-me de quando me tentaram matar em Bagdade. Quando havia e ainda há explosões e ataques contínuos.» Tem duas filhas que vivem e estudam em França.

Em 2005, Pascale e o marido, William, fundam a Hammurabi. Esta organização dos direitos do homem apoia minorias, deslocados e todos os que precisam de ajuda no Iraque. No âmbito deste trabalho tem acolhido e ouvido mulheres cristãs e yazidis resgatadas ao Daesh. Comove-se quando conta as histórias que ouviu da boca de mulheres e meninas violadas e escravizadas. Dão-lhe força para exigir justiça e lutar.

 
Quando defendeu, em Washington, perante membros do Congresso o genocídio, alguém lhe disse: «Genocídio é uma palavra política. Não pode dizer isso.» Pascale Warda perdeu a paciência: «Gritei e disse: “É político e económico para si, que está sentado atrás desta mesa! Mas é no nosso corpo que se passa, na nossa sociedade, na nossa vida. Vocês fecham os ouvidos! Todos!»
 Texto: Cláudia Sebastião
Fotos: Ricardo Perna, HHRO.org e Zinda Magazine

 
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