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«Tratar da vida conjugal é já evangelização»
29.04.2016
Existem muitos movimentos católicos em França e no mundo francófono envolvidos na pastoral familiar. Entre eles, a Amour & Vérité, que depende da Comunidade Emanuel. Acolhimento, grupos de reflexão, retiros nos santuários, formação em métodos naturais de controle de natalidade são organizados para acompanhar os casais, noivos, os jovens, mas também pessoas em união de facto: muitas categorias de pessoas que agora são aguardadas.



Especialista em direito canônico, o Pe. Cédric Burgun é também membro do Amour & Vérité há vários anos, em Paris. Ele explica que a preparação do matrimónio e o acompanhamento das famílias são muito importantes neste período. De acordo com ele, primeiro devemos combinar a vida conjugal com a fé. Além disso, o testemunho é fundamental para não apresentar uma visão desta vida muito idealizada e desconectada da realidade. A entrevista foi dada ao sítio Web do Conselho Pontifício para a Família.
 
Qual é o objetivo do Amour&Vérité?
Nós do Movimento Amour&Vérité (Amor e Verdade, em português) insistimos muito sobre o testemunho. Não podemos dar apenas um conteúdo intelectual aos casais que acolhemos, devemos também ensinar aos nossos casais de animadores a partilhar e a testemunhar o que vivem. Como foi afirmado numa das Assembleias sinodais sobre a família, a apresentação da vida matrimonial não deve ser idealizada, lenitiva, teórica e ausente da realidade. Procuramos, ainda, unir vida matrimonial e fé. Na verdade, em muitos casos existe uma visão dicotómica da vida de fé e da vida matrimonial, e uma vive sem ser influenciada pela outra. Também procuramos reavivar os métodos naturais transformando-os num caminho de fé e num caminho de luta, de dificuldades, de discernimento. Mas o ser difícil não significa que seja irrealizável.
 
Quais são os vossos setores de intervenção?
A Amour&Vérité organiza a preparação para o matrimónio, cuida do acompanhamento dos noivos. Existe também um ramo que orienta os casais em dificuldades, depois fazemos ainda propostas para os casais que esperam ter filhos, um problema crescente. Existe ainda um ramo para os métodos naturais que não só aprofunda o conhecimento de tais métodos, mas oferece também formações aos nossos casais comunitários para lhes permitir serem divulgadores destes métodos. Em França existe mesmo um deficit em termos de conhecimento e de número de instrutores para outros casais. E acolhemos além disso casais bastante afastados da fé mas que, por motivos ecológicos, medicinais, etc. não querem enfrentar uma contraceção física ou química e, por conseguinte, se dirigem aos métodos naturais.
Ora, de facto, só a Igreja oferece uma formação sobre este tema, sobretudo em França. A Amour&Vérité propõe também uma reflexão acerca dos adolescentes, com vista a acompanhá-los quando entram na idade adulta e antecipar o que João Paulo II, na "Familiaris Consortio", chamava formação a longo prazo para o matrimónio. Por fim, há retiros organizados para casais que já contam com dez anos de matrimónio e que procuram renovar o seu próprio sacramento e a sua vida matrimonial.
 
Pode-nos falar de outra iniciativa em que ande empenhado já há alguns anos...
Além da preparação matrimonial, existe a Escola de vida matrimonial, que se dirige não a jovens que têm inicialmente um projeto de vida de matrimónio, mas a jovens em uniões de facto, pessoas que vivem muitas vezes bastante afastados da Igreja que se interrogam sobre o matrimónio e não sabem como responder a isso. Não necessitam de uma preparação matrimonial mas de um discernimento: casar-nos-emos?
 
Que perfis têm os casais que recebeis, nestas duas formações?
São muito poucos os católicos com um ótimo conhecimento da fé, porque nem sequer 10 por cento da geração que atualmente se casa hoje em França seguiu cursos de catecismo, ainda que batizados. Mas quer sejam católicos ou não, andam marcados por esperanças e sofrimentos idênticos aos de todos os outros da sua geração. Na ordem da esperança, todos os jovens que acolhemos hoje têm, apesar de tudo, o desejo de ter uma vida matrimonial estável e que funcione.
Tem-se a impressão de que os jovens sejam contrários ao discurso eclesial sobre a vida matrimonial, a contraceção, etc. Não são contra, mas só ignoram. Querem conhecer o discurso da Igreja. Vejo nisto uma oportunidade formidável de evangelização, através da porta de ingresso da vida matrimonial, porque, de facto, não há outra instituição que forneça esta formação à vida familiar. No que respeita aos sofrimentos, os jovens são atingidos pelas mesmas dificuldades afetivas dos seus coetâneos. Chegam à preparação com todo este passivo afetivo marcado por uma forma de pesantez e de feridas. É um dado novo, que necessita de uma formação dos acompanhantes, uma vez mais com a finalidade de haver um discurso não idealizado, mas que parta da realidade da vida das pessoas.
 
Como melhorar a pastoral familiar?  
Foi o Sínodo sobre a família a observar que a formação ainda é hoje marcada por uma forma de idealização. A pastoral familiar não era necessariamente uma grande urgência na nova evangelização, mas foi isto que até o próprio Papa pediu. Estamos perante uma forma de conversão eclesial porque da vida conjugal andámos a fazer uma forma de pastoral conexa com todas as outras ao mesmo tempo que a vida conjugal, para a maioria dos nossos cristãos, está no centro da sua vida de fé. Voltando ao tema dos métodos naturais, existem, a falar verdade, ainda alguns lugares de formação em que existe um conteúdo muito reduzido sobre este tema, ainda que um discurso em campo afetivo e sexual não deva ser improvisado.
Desde há dez anos que estou empenhado na preparação de matrimónios e vejo que há uma forma de evolução: as esperanças existem sempre, mas há novas dificuldades e crescentes acerca da imprecisão relativa à diferença entre homem-mulher, provavelmente por causa dos debates da sociedade. Os debates são mais tensos. Existe ainda a questão do matrimónio tardio: embora tendo no fundo do coração a esperança de um matrimónio duradouro, os noivos e os conviventes temem sempre mais casar-se porque veem exemplos numerosos de casais que falharam.
 
Como pode a pastoral familiar contribuir para a evangelização?
O primeiro traço de Deus na Natureza não é a Revelação através dos profetas, mas a vida conjugal, no Livro do Génesis. Tratar da vida conjugal é já evangelização, ainda que não seja explícita a citar o nome de Cristo. Não se deve fazer, desde o início, uma dicotomia entre a vida conjugal e a evangelização explícita de Cristo. Por outro lado, a evangelização faz-se também através do acolhimento fraterno. Este é o ponto forte da Escola de vida conjugal que acolhe conviventes aos quais, demasiadas vezes, foi dito, desde os inícios, como uma forma de juízo negativo "não estais ainda casados". A EVC (Escola de Vida Conjugal) ainda não é uma preparação para o matrimónio mas um acolhimento, em si mesmo já evangelizador, por parte da comunidade cristã para ajudar na vida conjugal. 
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